Você já parou para pensar como é viver ouvindo apenas de um lado?
Para quem nunca passou por isso, a surdez unilateral pode parecer “menos grave” do que a perda auditiva total.
No entanto, a realidade é bem diferente.
A ausência da audição em um dos ouvidos afeta diretamente a vida social e profissional do trabalhador, trazendo limitações muitas vezes invisíveis.
É exatamente por esse motivo que a Lei Complementar nº 142/2013, em conjunto com a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), reconhece a surdez unilateral como uma forma de deficiência auditiva.
Assim, quem possui essa condição pode ter direito à aposentadoria da pessoa com deficiência (PcD), desde que cumpra os requisitos exigidos pelo INSS.
Neste artigo, você vai ficar por dentro sobre a Aposentadoria PcD por Surdez Unilateral, vamos lá?
Sumário
- Surdez Unilateral é considerada deficiência?
- Surdez unilateral como deficiência sensorial de longo prazo
- Aposentadoria PcD para quem tem Surdez Unilateral
- Uso de Aparelho Auditivo tira o direito?
- Documentos Médicos para comprovar a surdez unilateral no INSS
- Conclusão
Surdez Unilateral é considerada deficiência?
A primeira dúvida que surge para quem tem perda auditiva em apenas um ouvido é: a lei considera a surdez unilateral como deficiência?
A resposta é sim, embora esse reconhecimento tenha levado anos para se consolidar.
Mas o que é uma deficiência auditiva pela Lei?
De acordo com a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), pessoa com deficiência é aquela que possui impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
No caso da deficiência auditiva, a avaliação é feita pela audiometria, que mede a perda de audição em decibéis (dB).
A legislação considera deficiência auditiva a perda bilateral, parcial ou total, de 41 dB ou mais, em frequências relevantes para a comunicação humana.
Reconhecimento pela Lei Complementar nº 142/2013 e pela Lei nº 14.768/2023
A Lei Complementar nº 142/2013 regulamentou a aposentadoria diferenciada da pessoa com deficiência, assegurando tempo de contribuição e idade reduzidos para homens e mulheres que comprovem impedimentos de longo prazo.
Mais recentemente, a Lei nº 14.768/2023 deu um passo além: alterou dispositivos da legislação para incluir expressamente a surdez unilateral como deficiência auditiva, eliminando interpretações restritivas que antes geravam indeferimentos no INSS.
Surdez unilateral como deficiência sensorial de longo prazo
Embora muitos pensem que ouvir de um lado é suficiente, a surdez unilateral traz desafios concretos:
- dificuldade em localizar a origem dos sons;
- problemas de compreensão em ambientes ruidosos;
- fadiga auditiva causada pelo esforço constante de escuta;
- prejuízos à segurança, como dificuldade de perceber buzinas ou alarmes.
Essas limitações tornam a surdez unilateral uma deficiência sensorial de longo prazo, enquadrada na proteção legal brasileira.
Isso significa que o segurado com essa condição pode, sim, requerer a aposentadoria PcD, desde que seja reconhecida pela perícia biopsicossocial do INSS.
Qual é o grau de perda auditiva necessário para ser PcD?
Um dos pontos centrais para o reconhecimento da aposentadoria da pessoa com deficiência (PcD) é a comprovação do grau de perda auditiva.
No caso da surdez unilateral, essa comprovação é feita por exames clínicos e testes objetivos, como a audiometria tonal.
A legislação e as normas técnicas utilizadas pelo INSS seguem critérios internacionais definidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com esses parâmetros, é considerada deficiência auditiva a perda:
- igual ou superior a 41 decibéis (dB) em frequências essenciais para a comunicação humana (de 500 Hz a 3.000 Hz).
Esse valor é verificado no exame audiométrico realizado em consultório de otorrinolaringologista ou fonoaudiólogo.
É justamente esse laudo que será analisado na perícia médica do INSS.
Diferença entre surdez unilateral total e bilateral?
É importante destacar que a surdez unilateral total (perda completa em apenas um ouvido) também se enquadra como deficiência auditiva, pois compromete de forma significativa a localização espacial dos sons e a compreensão em ambientes ruidosos.
Já a surdez bilateral (perda em ambos os ouvidos) geralmente é classificada como mais severa, podendo ser enquadrada como deficiência moderada ou grave, a depender da intensidade medida na audiometria.
- Surdez unilateral: considerada deficiência auditiva, em regra classificada como leve, com impacto direto no tempo de contribuição exigido.
- Surdez bilateral: pode ser enquadrada como moderada ou grave, garantindo ainda mais redução no tempo para aposentadoria.
Assim, o ponto de partida é sempre o exame audiométrico, que servirá como base para a classificação do grau de deficiência pela perícia biopsicossocial do INSS.
Aposentadoria PcD para quem tem Surdez Unilateral
A surdez unilateral, após reconhecida como deficiência auditiva pela lei, pode garantir o direito à aposentadoria diferenciada da pessoa com deficiência (PcD).
No entanto, esse benefício não é automático: o segurado precisa cumprir requisitos de idade, tempo de contribuição e passar pela avaliação da perícia do INSS.
A Lei Complementar nº 142/2013 estabeleceu duas formas de aposentadoria para a pessoa com deficiência: por tempo de contribuição e por idade.
Em ambos os casos, é necessário:
- Cumprir a carência mínima de 180 contribuições (15 anos);
- comprovar, por meio de perícia médica e social, a existência da deficiência.
Vamos ver o funcionamento de cada uma:
Aposentadoria por Idade da Pessoa com Deficiência por Surdez Unilateral
Essa modalidade é destinada a quem trabalhou por longos anos convivendo com a deficiência, mesmo que parcial.
Os requisitos são:
- Homem: 60 anos de idade + 15 anos de contribuição.
- Mulher: 55 anos de idade + 15 anos de contribuição.
- Comprovar a deficiência (leve, moderada ou grave) na data do requerimento.
O ponto essencial é que não basta apenas completar 15 anos de contribuição “comuns”.
É preciso demonstrar que, durante esse período mínimo, o trabalhador já convivia com a deficiência auditiva.
Ou seja: se a surdez unilateral surgiu em 2010, e o segurado já contribuía desde 1995, apenas as contribuições a partir de 2010 podem ser consideradas para cumprir os 15 anos exigidos.
Isso faz com que laudos antigos, exames audiométricos e histórico médico sejam documentos decisivos.
Valor da Aposentadoria por Idade PcD por Surdez Unilateral
Basicamente o cálculo funciona assim:
- O benefício não começa em 100% da média.
- O coeficiente inicial é 70% da média de todos os salários de contribuição.
- Acrescenta-se 1% a cada ano de contribuição.
Para você entender melhor, vou te dar um exemplo:
Maria tem 55 anos, surdez unilateral comprovada há 20 anos e contribuiu ao INSS por 20 anos.
- Média salarial: R$ 3.000,00.
- Coeficiente: 70% + 20 anos = 90%.
- Valor do benefício: R$ 2.700,00.
Em resumo: quanto mais tempo de contribuição, maior o valor.
Aposentadoria por Tempo de Contribuição da Pessoa com Deficiência por Surdez Unilateral
A modalidade por tempo de contribuição PcD é geralmente mais vantajosa porque garante 100% da média dos salários e permite converter tempo comum em tempo PcD.
Os requisitos são:
- Tempo de Contribuição: Vai depender da gravidade da deficiência
- Deficiência Grave: 25 anos (homens), 20 anos (mulheres).
- Deficiência Moderada: 29 anos (homens), 24 anos (mulheres).
- Deficiência Leve: 33 anos (homens), 28 anos (mulheres).
- Idade mínima:
- Não tem!
Veja a tabela de tempo de contribuição PcD para entender melhor:
Requisitos Aposentadoria por Tempo de Contribuição PcD por Surdez | ||
Grau da Deficiência | Homem | Mulher |
Leve | 33 anos de Tempo de Contribuição | 28 anos de Tempo de Contribuição |
Moderada | 29 anos de Tempo de Contribuição | 24 anos de Tempo de Contribuição |
Grave | 25 anos de Tempo de Contribuição | 20 anos de Tempo de Contribuição |
Diferença importante: nem todo o tempo de contribuição precisa ter sido na condição de PcD.
- Se a surdez unilateral surgiu depois de anos de trabalho, o tempo anterior pode ser aproveitado mediante conversão, de acordo com tabela prevista no Decreto 3.048/99.
Por exemplo:
João trabalhou 20 anos sem deficiência e depois, já com surdez unilateral, mais 12 anos.
- O INSS converte parte dos 20 anos em tempo PcD.
- Somando esse tempo convertido com os 12 anos já como PcD, João pode completar os 33 anos exigidos e se aposentar com 100% da média salarial.
Valor da Aposentadoria por Tempo de Contribuição PcD por Surdez Unilateral
A Aposentadoria por Tempo de Contribuição PcD costuma ser a mais vantajosa porque:
- Garante 100% da média de todos os salários de contribuição desde julho/1994.
- Não aplica redutores (como fator previdenciário ou fórmula 60% + 2%).
- Permite a conversão do tempo comum em tempo PcD, se a deficiência não existia desde o início da vida laboral.
Basicamente o cálculo da Aposentadoria PcD por Tempo de Contribuição Funciona assim:
- O INSS calcula a média aritmética de todos os salários de contribuição (corrigidos monetariamente).
- O segurado recebe 100% dessa média.
Veja um exemplo para que você entenda melhor:
Carlos, 55 anos, surdez unilateral desde jovem, contribuiu por 33 anos.
- Média salarial: R$ 4.000,00.
- Como atingiu o tempo exigido para Aposentadoria PcD por Grau Leve (33 anos), terá direito a 100% da média.
- Valor da aposentadoria: R$ 4.000,00.
Uso de Aparelho Auditivo tira o direito?
Uma das dúvidas mais comuns de quem tem surdez unilateral é se o uso de aparelho auditivo ou implante coclear pode atrapalhar o reconhecimento da deficiência no INSS.
A resposta é não.
O fato de utilizar um aparelho auditivo ou mesmo um implante coclear não elimina a condição de pessoa com deficiência.
Isso porque a legislação brasileira, em especial a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), define a deficiência como um impedimento de longo prazo que, em interação com barreiras, pode obstruir a participação plena da pessoa na sociedade.
Preciso estar com a carteira registrada como PcD para ter direito?
Não.
O direito à aposentadoria da pessoa com deficiência (PcD) não depende de ter a carteira de trabalho registrada como PcD, nem de possuir laudo de empresa reconhecendo a condição.
O que o INSS avalia é se o segurado tem deficiência de longo prazo, comprovada por:
- Laudos médicos e exames audiométricos que indiquem a perda auditiva;
- Histórico clínico mostrando desde quando existe a limitação (fundamental para a aposentadoria por idade PcD, que exige 15 anos já convivendo com a deficiência);
- Avaliação biopsicossocial realizada na perícia do INSS, que combina análise médica e social para classificar o grau da deficiência (leve, moderada ou grave).
Documentos Médicos para comprovar a surdez unilateral no INSS
Para ter o direito reconhecido à aposentadoria PcD por surdez unilateral, não basta declarar a deficiência: é preciso apresentar provas concretas.
O INSS exige um conjunto de documentos médicos e trabalhistas que demonstrem a existência e a duração da perda auditiva.
Veja os documentos médicos principais:
- Audiometria tonal e vocal: exame fundamental, que mede o grau de perda auditiva em decibéis (dB)
- Laudo de otorrinolaringologista: descrevendo a perda auditiva, se é total ou parcial, unilateral ou bilateral.
- Exames complementares (impedanciometria, BERA, ressonância magnética, quando houver): ajudam a demonstrar a causa da perda.
- Histórico clínico: prontuários, relatórios médicos antigos e receitas de aparelhos auditivos que mostrem desde quando a deficiência existe.
Dica estratégica: exames mais antigos podem ser decisivos para provar que a deficiência existe há pelo menos 15 anos, requisito obrigatório na aposentadoria por idade PcD.
Além dos documentos apresentados, o segurado passará por uma perícia médica e social no INSS.
- Médica: verifica os exames, faz nova avaliação auditiva e confirma a perda.
Social: avalia de que forma a surdez unilateral impacta a vida do segurado (locomoção, comunicação, segurança no trabalho, inclusão social).
Como dar entrada na Aposentadoria PcD por Surdez Unilateral
O primeiro passo é separar todos os documentos que comprovam a sua condição.
Depois, dar entrada no pedido, veja o passo a passo:
- Acesse o Meu INSS (site ou aplicativo).
- Entre com a conta gov.br.
- Clique em “Novo Pedido”.
- Pesquise por “aposentadoria da pessoa com deficiência”.
- Selecione por idade PcD ou por tempo de contribuição PcD, conforme seu caso.
- Preencha as informações solicitadas.
- Anexe os documentos digitalizados (de preferência em PDF).
- Confirme e anote o número do protocolo.
Após o protocolo, o INSS agenda duas avaliações:
- Perícia médica: verifica a perda auditiva nos exames apresentados e pode realizar nova avaliação.
- Perícia social: entrevista realizada por assistente social, que avalia como a surdez afeta sua vida diária, trabalho e integração social.
Essas duas etapas juntas compõem a perícia biopsicossocial, exigida pela Lei Complementar 142/2013 e regulamentada pela Instrução Normativa 128/2022 do INSS.
Como funciona a perícia biopsicossocial para deficiência auditiva
O INSS não se limita a olhar apenas a perda em decibéis da audiometria.
O critério oficial é o Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado (IFBrA), que mede o impacto real da deficiência na vida da pessoa.
Veja o que é analisado na prática:
- Comunicação: você consegue compreender instruções no trabalho e em ambientes ruidosos?
- Autonomia: precisa de leitura labial, Libras, aparelho auditivo ou ajuda de terceiros para interagir?
- Dependência: mesmo com recursos de apoio, existem atividades em que precisa de outra pessoa?
- Inclusão social: a surdez gera barreiras em treinamentos, reuniões e atividades coletivas
Com base no IFBrA e nas observações, o INSS enquadra a surdez como:
- Leve: a pessoa realiza a maioria das atividades sozinha, mas enfrenta barreiras em ambientes específicos (como locais barulhentos ou sem leitura labial).
- Moderada: exige apoio frequente (uso contínuo de aparelho auditivo, intérprete de Libras ou suporte no trabalho).
- Grave: dependência significativa de terceiros ou ausência de resposta a aparelhos. É comum em casos de surdez bilateral profunda.
Na prática, a surdez unilateral quase sempre é reconhecida como deficiência leve, mas dependendo do impacto social e laboral pode ser classificada como moderada.
Além dos exames, o perito considera:
- Gravidade da perda auditiva (em dB).
- Resposta a aparelhos auditivos (lembrando: a avaliação é feita sem o aparelho).
- Impacto nas atividades diárias (trabalho, estudo, vida social).
- Condições socioambientais (se o segurado tem acesso a tecnologias de apoio e suporte familiar).
- Aspectos emocionais (isolamento social, ansiedade ou perda de autoestima relacionados à surdez).
Conclusão
A surdez unilateral já é reconhecida pela legislação brasileira como uma forma de deficiência auditiva, e por isso garante acesso às regras diferenciadas da aposentadoria da pessoa com deficiência (PcD).
Mesmo ouvindo de um dos lados, as barreiras enfrentadas no trabalho e na vida social são reais, e a lei leva isso em consideração.
No entanto, cada modalidade de aposentadoria (por idade ou por tempo de contribuição) tem regras específicas de cálculo e requisitos.
Muitas vezes, um pequeno detalhe, como a data em que a deficiência começou ou a conversão de tempo comum em tempo PcD, pode mudar totalmente o valor do benefício.
Se você tem surdez unilateral e está pensando em dar entrada na aposentadoria, busque orientação de um advogado previdenciário especializado.
Até o próximo artigo!